Cabo Ligado

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Cabo Ligado Semanal: 12-18 de Junho de 2023

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  • Número total de ocorrências de violência: 1,650

  • Número total de fatalidades reportadas de violência: 4,695

  • Número total de fatalidades reportadas por violência contra civis: 2,010

    Acesse os dados.

Resumo da Situação

A semana passada foi excepcionalmente calma em Cabo Delgado. Uma fonte relatou a continuação da atividade insurgente ao longo da costa de Macomia, especificamente na área em torno de Ntoni, o que levou alguns pescadores a abandonar a área para Pemba ou sede do distrito de Macomia. No dia 13 de Junho, Valige Taubo, governador de Cabo Delgado, visitou a aldeia vizinha de Pangane, que os insurgentes têm visitado regularmente desde Fevereiro, e incentivou a população local a retomar suas vidas normais.

As forças de segurança têm sido criticadas por não perseguirem os insurgentes nesta área, mas a 19 de Junho foi lançada uma operação conjunta das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM) e da Missão da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral em Moçambique (SAMIM) em torno de Pequeue, cerca de 15 quilômetros o norte de Ntoni. Sabe-se que os insurgentes estiveram em Pequeue no dia 7 de Junho. A operação conjunta irá complementar as patrulhas da SAMIM que estão a decorrer em torno de Mucojo, a sul de Pangane.

Foco Semanal: A Indisciplina das Forças de Segurança Desafia o Regresso e a Reconstrução

A morte de um professor na vila sede de Mocímboa da Praia, na semana passada, contribuiu ainda mais para a insatisfação existente em relação às forças de segurança na vila. Tais incidentes de violência contra civis por forças estatais não são novidade. No entanto, no contexto da atividade insurgente reduzida e do crescente retorno dos deslocados, esses incidentes representam um desafio significativo para o Estado moçambicano. Em primeiro lugar, representam um desafio ao Estado para manter a segurança básica nas zonas de regresso. Em segundo lugar, torna mais urgente a necessidade da reforma do sector de segurança, nomeadamente a integração das Forças Locais nas FADM, tal como está legislado. O fracasso nestas áreas corre o risco de os insurgentes se inserirem com sucesso nas comunidades, como os vemos a tentar em Macomia.

Segundo fonte na vila de Mocímboa da Praia, realizou-se uma reunião pública no bairro da Pamunda, onde o professor faleceu, no passado dia 10 de Junho. A fonte fala de uma 'campanha' iniciada sob o lema “Majeshi Atiwasaka”, que significa “não queremos as forças”, referindo-se às forças policiais e militares na língua Kimwani.

 Os dados da ACLED mostram três incidentes de violência contra civis por parte das forças do Estado moçambicano na vila sede de Mocímboa da Praia desde o início do ano. Duas vidas foram ceifadas nesses incidentes. Localmente, a percepção é de que a taxa é muito mais elevada. Um dos intervenientes na reunião de 10 de Junho afirmou que até 10 pessoas morreram dessa forma desde seu retorno à vila. Como o retorno começou com maior vigor em Outubro de 2022, era provável que  se estivesse a referir-se a essa altura. O desafio em garantir a segurança básica na vila é grande. Dos quase 104.000 regressados no distrito, 68% viviam na sede distrital, na altura da Avaliação de Abril da Organização Internacional para as Migrações. A grande maioria destes regressou desde Outubro do ano passado.

As FADM têm reconhecido, pelo menos ao nível superior, que as relações com as comunidades da província precisam de ser significativamente melhoradas. Numa conferência realizada no ano passado no Instituto Superior de Estudos de Defesa, um oficial falou de sua falta de compreensão das normas culturais no norte do país. Falou também da falta de compreensão das FADM para com as comunidades, e como “o inimigo dificilmente se distingue da população civil”.

Na atual fase do conflito, essa desconexão com as comunidades  constitui um desafio à reforma do sector de segurança. Um decreto-lei aprovado em Abril permite a incorporação das Forças Locais nas FADM. No entanto, desacordos recentes entre a Unidade de Intervenção Rápida da polícia e a milícia Naparama, no distrito de Ancuabe, e entre as FADM e as Forças Locais em Miangelewa, no distrito de Muidumbe, indicam que essa reforma não será fácil. As Forças Locais e a milícia Naparama partilham as características da língua e cultura do norte do país que as FADM, com tropas vindas do sul, podem ter dificuldade em interpretar e em interagir.

Isso deixa os cidadãos com decisões pouco invejáveis a tomar. As constantes abordagens dos insurgentes às comunidades da zona costeira de Macomia obrigam os recém-regressados a correrem o risco de serem vistos como colaboradores das forças do Estado. Essas mesmas forças fornecem proteção limitada contra insurgentes. Potenciais regressados à costa de Macomia, que levantaram essas preocupações junto do administrador distrital, foram aconselhados a lidar eles próprios com os insurgentes.

Resumo Semanal

Relatório da OMR indica níveis de trauma de conflito na comunidade

O mais recente relatório do Observatório do Meio Rural (OMR) analisa a situação humanitária na província de Cabo Delgado. Talvez as suas conclusões mais impressionantes digam respeito ao impacto pessoal do conflito nas pessoas em toda a província. O inquérito da OMR foi realizado nos distritos de Chiúre, Metuge, Mocímboa da Praia, Metuge e Palma. No geral, 43% dos inquiridos relataram um membro da família “assassinado”, 34% relataram pelo menos um membro da família “sequestrado”, enquanto 18% relataram família “desaparecida”.

Os números para aqueles com membros da família “assassinados” e “desaparecidos” foram consideravelmente mais altos em Afungi. Em Monjane, também conhecido por Mondlane, os valores respectivos foram de 57% e 34% dos inquiridos, respectivamente. Desta forma, o estudo revela o impacto considerável e duradouro do conflito em indivíduos, famílias e comunidades.

Esses números não são diretamente comparáveis aos divulgados pelo jornalista britânico Alex Perry no mês passado. Os números de OMR cobrem todo o conflito, enquanto os de Perry cobrem os combates em Palma em Março de 2021, e as suas consequências. Os números da OMR também incluem especificamente perdas familiares nas mãos das Forças de Defesa e Segurança.

A Pesca e o café florescem no distrito do Ibo

O distrito do Ibo em Cabo Delgado, teve um primeiro trimestre de 2023 bem-sucedido, capturando 1.726 toneladas de peixe, representando 51% da sua meta anual. Os agricultores também semearam 33 hectares de café – 67% de sua meta e 4% a mais que no ano anterior.

Os números foram apresentados pelo Administrador Distrital Issa Tarmamade na reunião do Conselho Executivo Provincial de Cabo Delgado, realizada em Pemba no dia 15 de Junho. Embora os números oficiais possam por vezes ser vistos com desconfiança, o distrito do Ibo tem estado relativamente pacífico e em posição de alcançar algum desenvolvimento. O incidente mais recente de violência política registrado nos dados do ACLED foi em Março de 2022.

O Café do Ibo esteve entre as marcas apresentadas pelo Ministro da Agricultura e Desenvolvimento Rural, Celso Correia, em Londres na semana passada, onde formalmente inscreveu Moçambique como membro da Organização Internacional do Café, um clube de exportadores e grandes importadores de café.

A produção de café no Ibo está a ser apoiada pela Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial, a Fundação Illy, o Ministério da Agricultura e uma associação de produtores locais.

Confronto entre o Ministro da Defesa e chefe do Estado-Maior do Exército

As tensões entre o Ministro da Defesa Nacional de Moçambique, Cristóvão Chume, e o chefe do Estado-Maior do Exército, Joaquim Rivas Mangrasse, estão alegadamente a dificultar as operações militares em Cabo Delgado. Mangrasse muitas vezes se recusa a implementar as decisões de Chume e falta regularmente às sessões do conselho consultivo do Ministério da Defesa, de acordo com a Africa Intelligence.

Tanzânia impede abertura da fronteira de Namoto, diz chefe de polícia

Contrariamente às informações anteriores, parece que o posto fronteiriço de Namoto, no distrito de Palma, ainda não foi totalmente reaberto. O chefe da polícia moçambicana, Bernardino Rafael, afirmou que a reabertura depende das autoridades da Tanzânia, que ainda não deram luz verde, apesar de todas as infraestruturas necessárias estarem instaladas do lado moçambicano. Do lado da Tanzânia, a fronteira não está operacional, até porque a estrada de acesso ao posto fronteiriço de Kilambo foi bastante danificada pelas últimas chuvas, segundo fonte local. Até à reabertura oficial da fronteira, os comerciantes de Palma terão de utilizar o posto fronteiriço de Negomano, no distrito de Mueda.

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