Cabo Ligado Update: 16-29 de Setembro de 2024
Resumo da situação
Após uma aparente calmaria de várias semanas, as forças de segurança enviaram tropas terrestres para Macomia no âmbito de uma ofensiva em curso, visando um território que tem sido sistematicamente bombardeado por helicópteros ruandeses desde o final de Julho. No dia 17 de Setembro, os meios de comunicação social locais noticiaram que uma força conjunta de tropas moçambicanas e ruandesas tinha atacado uma base insurgente em Quiterajo, matando cinco combatentes do Estado Islâmico de Moçambique (EIM). No dia seguinte, o governador de Cabo Delgado, Valige Tauabo, anunciou que o governo e as tropas ruandesas haviam recapturado a crítica vila costeira de Mucojo.
No entanto, a área claramente não estava totalmente segura, uma vez que as tropas moçambicanas e ruandesas entraram em confronto com insurgentes nos arredores de Mucojo entre 24 e 26 de Setembro e sofreram pelo menos quatro baixas no segundo dia, de acordo com o chefe do Estado-Maior do Comando Operacional do Norte, General Omar Saranga. O general informou ainda que pelo menos 10 insurgentes foram mortos e quatro foram capturados no dia 25 de Setembro. O Estado Islâmico (EI) alegou ter ferido vários soldados moçambicanos e ruandeses no confronto. Uma fonte do Cabo Ligado viu veículos militares a acelerar em direção a Mucojo no dia 25 de Setembro. A emissora estatal TVM informou que os insurgentes haviam colocado engenhos explosivos em estradas importantes para a costa de Macomia, dificultando os movimentos das forças de segurança, um desafio destacado pelo Cabo Ligado em Agosto.
Os confrontos foram mencionados pelo Presidente Filipe Nyusi ao discursar numa cerimónia para assinalar o Dia das Forças Armadas, a 25 de Setembro. Disse que o governo controlava a vila de Mucojo, mas que os insurgentes ainda estavam activos em “algumas áreas das florestas do posto administrativo de Mucojo”. Reconheceu que as tropas governamentais estiveram “em combate directo com o inimigo” e que os insurgentes que operam entre Mucojo e Quiterajo “estão a tentar encontrar meios logísticos para sustentar as suas acções”.
Numa grande violação de segurança no distrito de Palma, os insurgentes decapitaram um homem a menos de 10 km da vila sede de Palma nas primeiras horas de 26 de Setembro, marcando o primeiro ataque tão perto da vila desde pelo menos 2022. O EI afirmou que o incidente ocorreu na aldeia de Manguna, mas Cabo Ligado entende que foi em campos próximos, perto da estrada para Pundanhar. O pânico espalhou-se por toda a vila de Palma, mas a calma foi restaurada no final do dia.
No distrito de Mocímboa da Praia, insurgentes atacaram a aldeia de Mbau a 17 de Setembro e mataram pelo menos uma pessoa, tendo o EI reivindicado a autoria do ataque nas redes sociais. Mbau tornou-se claramente um alvo importante para os insurgentes do EIM, pois este é o terceiro ataque à vila desde 20 de Agosto, apesar de esta ser o local de uma importante base operacional avançada do Ruanda.
Relatos continuaram a surgir de insurgentes a procurar comida. O administrador distrital de Mocímboa da Praia, Sérgio Cipriano, informou que os insurgentes sequestraram cinco mulheres em campos fora da aldeia de Chinda a 27 de Setembro na N380 e pediram-lhes como resgate batatas, mandioca e tomates. Cipriano afirmou também que os insurgentes perguntaram se seriam amnistiados se se rendessem. Um pequeno grupo de insurgentes foi também avistado no distrito de Nangade, circulando pelas aldeias de Chitama, Quinto Congresso e Nkonga, pedindo ocasionalmente comida, disse uma fonte ao Cabo Ligado.
Enquanto isso, parece que alguns insurgentes foram forçados a fugir para as florestas do distrito de Quissanga pela ofensiva das forças de segurança em Macomia.
Foco: Nyusi sobre a insurgência
O Dia das Forças Armadas comemora o início da guerra de libertação a 25 de Setembro de 1964. Este ano, o Presidente Nyusi aproveitou a ocasião para fornecer a sua compreensão mais detalhada até então sobre a insurgência no norte de Moçambique, abordando as suas origens, natureza transnacional e liderança.
Primeiro, Nyusi reconheceu as raízes profundas da insurgência no norte de Moçambique. Falou da chegada de pessoas da região dos Grandes Lagos em 2009 e citou suas conexões com as Forças Democráticas Aliadas, agora também conhecidas como Província do Estado Islâmico da África Central. Tmbém referiu a contribuição de alguns dos que retornaram de estudos religiosos no exterior.
Durante seu discurso, Nyusi reconheceu a contribuição das forças de Ruanda, Tanzânia e da Missão da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral em Moçambique. Não mencionou a missão malfadada do Wagner Group em Cabo Delgado, do final de 2020 ao início de 2021. O Dyck Advisory Group (DAG), um contratante militar privado sul-africano, também não foi mencionado. O DAG esteve operacional em Cabo Delgado de Abril de 2020 até Março de 2021.
Sobre o estado atual dos insurgentes, Nyusi confirmou que 'Ulanga', um tanzaniano, continua a ser o líder do grupo, "assistido por Faridi Suleiman Haruni". Pensa-se que Ulanga tenha sido nomeado líder espiritual em Abril de 2023. Um relatório que circulou na altura referiu que um "Farido" era o comandante militar geral, com Bonomade Machude Omar encarregado das operações. Embora Omar tenha sido morto mais tarde naquele ano, a presença contínua de Ulanga e Faridi/Farido indica estabilidade na liderança do grupo.
Ao discutir o financiamento da insurgência, Nyusi apontou o papel dos sequestros e da extorsão de empresas como importantes fontes de rendimento para os insurgentes. No entanto, ele também observou o “apoio financeiro e militar” fornecido pelo EI. Embora tenha sido demonstrado que o EI financiou o grupo, acredita-se que o apoio militar seja limitado à assistência técnica e ao recrutamento.
O presidente referiu-se a um programa de propaganda e desradicalização que, segundo ele, está em andamento desde Agosto de 2022. No entanto, ele não indicou nenhuma mudança na atual abordagem intransigente do Estado em relação à insurgência, evitando qualquer sugestão de negociações. Proseguiu alertando as pessoas para não colaborarem com "terroristas", pois é "difícil não dar espaço para as pessoas comentarem sobre a falta de direitos humanos ao tentar resolver um problema real". Isso reflete a prática atual no distrito de Macomia, onde as operações estão atualmente focadas. Até agora, em 2024, os dados da ACLED mostram que 29% dos eventos de violência política no distrito de Macomia envolvendo forças estaduais tinham como alvo civis.
Resumo de Notícia:
Propagandistas do EI alegam truques sujos
Os produtores de um podcast em língua Kiswahili do EI alegaram que suas produções estão a ser distribuídas por um canal falso. Alegam que o canal falso está a ser usado para atrair potenciais recrutas, que depois desaparecem. A alegação foi feita numa declaração divulgada a 28 de Setembro no canal do Telegram que o grupo usa para distribuir o podcast e manter contato com os seguidores. A declaração afirma que conheciam os responsáveis pela operação, "até mesmo de vista", dizendo que eles estão baseados em Mombasa, no Quênia, e na Tanzânia. Em outra declaração em 30 de Setembro, os produtores ameaçaram que "não os deixaremos em paz enquanto eles não nos deixarem em paz".
Político alega massacre em Palma
Uma reportagem no Politico alega que membros de uma “unidade de comando” das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM) mantiveram cerca de 250 homens de aldeias ao sul de Palma em contentores na entrada do projeto Moçambique LNG por três meses em 2021. A reportagem alega que a maioria foi morta durante esse período, mas não está claro sobre o número real de supostas fatalidades. Cabo Ligado não conseguiu comprovar a reportagem.
Nyusi inaugura quartel da UIR em Cabo Delgado, com memorial a Mark Tout
O presidente Nyusi inaugurou uma nova base de 183 milhões de meticais (2.865.245 dólares norte-americanos) para a Unidade de Intervenção Rápida da polícia no distrito de Metuge, em Cabo Delgado, a 28 de Setembro, o maior quartel construído desde a independência de Moçambique em 1975. A base inclui um memorial ao sul-africano Mark Gilbert Tout e ao atirador da polícia moçambicana Safinate Bernardo Matai, que foram mortos quando a aeronave ligeira Bat Hawk de Tout despenhou-se em Cabo Delgado em Abril. O memorial erguido na praça do desfile descreveu Tout como um "piloto de atirador furtivo" e inclui uma foto dele em seu Bat Hawk. O campo de tiro recebeu o nome de Matai.
Chefe das Forças Armadas de Moçambique reúne-se com comandantes ruandeses e tanzanianos
O chefe das FADM, Almirante Joaquim Mangrasse, encontrou-se com o Major General Emmy Ruvusha, comandante das Forças de Segurança de Ruanda em Cabo Delgado, no dia 27 de Setembro para rever os esforços militares conjuntos contra a insurgência. Mangrasse também discutiu a cooperação em segurança com o chefe das forças armadas da Tanzânia, General Jacob Mkunda, durante sua visita a Maputo a 25 de Setembro para participar das comemorações do 60º aniversário das FADM. A Tanzânia ainda opera uma força de contra-insurgência no distrito de Nangade, em Cabo Delgado.
Macomia e Quissanga não são seguros para reabertura de escolas, diz representante dos professores
Uma representante sénior da Organização Nacional de Professores, Dinita Dos Santos Dinis, criticou a pressão do governo para que os professores retornem aos distritos de Macomia e Quissanga em Cabo Delgado. Ela considerou um "ilusão perigosa" alegar que a segurança foi restaurada. Argumentou que os distritos continuam inseguros, e o governo deve garantir segurança genuína antes de reabrir as escolas lá.
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