Cabo Ligado

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Cabo Ligado Semanal: 2-8 de Agosto

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  • Número total de ocorrências de violência organizada: 951

  • Número total de vítimas mortais de violência organizada: 3,218

  • Número total de mortes reportadas de alvos civis: 1,471

Observação: as actualizações de dados em tempo real do ACLED foram interrompidas até o final de Agosto de 2021. Os dados para o período de 31 de Julho a 3 de Setembro serão divulgados a 6 de Setembro, altura em que a publicação de dados em tempo real será retomada. Todos os dados do ACLED estão disponíveis para download através da ferramenta de exportação de dados e ficheiros de dados curados.

Resumo da Situação

O acontecimento mais notável em Cabo Delgado na semana passada foi a recuperação da vila de Mocímboa da Praia pelas tropas ruandesas e moçambicanas, que foi anunciada no dia 8 de Agosto. A batalha por Mocímboa da Praia e suas implicações serão exploradas extensivamente no foco do incidente desta semana.

Houve, contudo, outros incidentes confirmados que tiveram lugar na semana passada, a maioria dos quais fazia parte da ofensiva mais ampla do governo no distrito de Mocímboa da Praia. No dia 3 de Agosto, helicópteros moçambicanos dispararam contra uma suposta patrulha insurgente perto da aldeia Quelimane, no distrito de Mocímboa da Praia, na estrada entre Mocímboa da Praia e Palma. Não há relatos de baixas disponíveis.

No mesmo dia, helicópteros governamentais também dispararam contra uma suposta patrulha insurgente perto da foz do rio Messalo, que forma a fronteira sul do distrito de Mocímboa da Praia. Novamente, não há relatos de baixas disponíveis.

As tropas terrestres a trabalhar em unidades conjuntas ruandesas e moçambicanas também foram reportadas no dia 3 de Agosto a operar ao longo do corredor N380 e mais ao sul no distrito de Mocímboa da Praia. Desdobramentos foram relatados em Awasse, Chinda, Mbau e na vila de Mocímboa da Praia, mas nenhum detalhe sobre esses confrontos foi relatado.

A missão de Força em estado de Alerta da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral em Moçambique, que adoptou a sigla SAMIM, teve a sua  primeira baixa confirmada no dia 3 de Agosto. Um soldado de Botswana morreu em um acidente de viação em Pemba. Não há qualquer indicação de que os insurgentes tenham desempenhado algum papel em sua morte.

O Estado Islâmico (EI) também divulgou outra reivindicação sobre um ataque em Cabo Delgado na semana passada, dizendo que os seus combatentes entraram em confronto com as tropas moçambicanas perto de Awasse no dia 26 de Julho, matando um número não especificado de soldados moçambicanos. Em tempo e local, se não em outros detalhes, a reivindicação alinha-se com uma alegada escaramuça entre as tropas ruandesas e os combatentes insurgentes em Awasse no dia 26 de Julho. O governo ruandês afirmou ter morto cinco insurgentes e não ter sofrido baixas nos combates.

Foco do incidente: Mocímboa da Praia

Os acontecimentos que antecederam o anúncio no dia 8 de Agosto de que as forças moçambicanas e ruandesas estavam no controlo total da vila de Mocímboa da Praia pela primeira vez desde Agosto de 2020 ainda não são totalmente conhecidos. Nem os ministérios da defesa de Ruanda nem de Moçambique deram um relato completo da ofensiva que resultou na recaptura da vila e os jornalistas moçambicanos não conseguiram acompanhar o avanço em primeira mão. 

As melhores indicações de fontes próximas dos militares moçambicanos dão conta de que a maior parte das batalhas pela vila tiveram lugar nos dias 2 e 3 de Agosto. No dia 1 de Agosto, as tropas ruandesas e moçambicanas deslocaram-se por terra na estrada N380 alegadamente para  o extremo oeste da vila de Mocímboa da Praia, encontrando lá alguma resistência por parte dos insurgentes. Na tarde de 2 de Agosto, navios interceptores foram vistos saindo de Pemba transportando tropas ruandesas e moçambicanas para Mocímboa da Praia. Naquela noite, essas tropas desembarcaram no extremo leste de Mocímboa da Praia e travaram uma batalha significativa com os insurgentes. Helicópteros moçambicanos foram destacados para apoiar o ataque anfíbio. Após uma breve pausa durante a noite, o ataque foi retomado no final da manhã de 3 de Agosto e houve combates intensos na vila ao longo do dia. No dia 4 de Agosto, as operações conjuntas de Moçambique e Ruanda na vila foram revertidas para uma escala menor, tentando consolidar o controlo de edifício por edifício. Entre 4 e 8 de Agosto, houve pequenos contra-ataques periódicos de insurgentes na área de Mocímboa da Praia, mas as forças combinadas continuaram a expandir sua área de controlo. Nenhuma estimativa de baixas está disponível para qualquer um desses confrontos.

Mesmo com os detalhes do combate tão difíceis de vir à tona, parece que os insurgentes não lutaram tanto para manter a vila de Mocímboa da Praia quanto para tomá-la. O ataque insurgente a Mocímboa da Praia em Agosto passado envolveu ataques sustentados com contingentes de combatentes, enquanto a defesa da vila parece ter envolvido principalmente pequenos grupos que recuaram diante dos ataques da força conjunta, em vez de resistir e lutar. Mesmo os militares ruandeses, quando questionados a 5 de Agosto após a maior parte dos combates por Mocímboa da Praia terem passado, estimaram que tinham morto apenas 70 insurgentes em todas as suas operações em Cabo Delgado. Também não há indicação de que as forças combinadas tenham recuperado qualquer um dos muitos civis sequestrados na ocupação inicial da vila pelos insurgentes. Portanto, embora a recuperação de Mocímboa da Praia seja uma importante vitória estratégica e simbólica para o governo moçambicano, não é claro se constitui uma redução significativa na capacidade da insurgência para a violência. 

A vitória do governo em Mocímboa da Praia esclarece, no entanto, alguns pontos. O primeiro é que a chegada de tropas ruandesas levou a uma mudança no equilíbrio do poder em Cabo Delgado. As forças moçambicanas sozinhas não conseguiram romper o corredor N380, apesar das repetidas tentativas, mas o apoio do Ruanda permitiu-lhes fazê-lo de forma relativamente rápida. A recuperação de Mocímboa da Praia agora cria possibilidades estratégicas para o governo ao mesmo tempo que retira da insurgência uma de suas grandes vitórias de propaganda. Com a estrada entre Mueda e Mocímboa da Praia agora aberta ao tráfego militar, as forças governamentais podem concentrar- se na abertura da estrada ao norte de Mocímboa da Praia a Palma, permitindo a circulação de activos do governo entre áreas que haviam sido anteriormente cortadas. Mocímboa da Praia pode também servir de ponto de partida para operações na zona sul do distrito, junto ao rio Messalo, onde se diz existirem bases insurgentes mais populosas.

A operação também deixa claro que Ruanda está agora a desempenhar um papel de liderança tanto no combate à insurgência no terreno quanto na elaboração da narrativa contra-insurgente nos meios de comunicação social. Os meios de comunicação ruandeses foram trazidos a Cabo Delgado para cobrir as tropas do seu país e os oficiais de relações públicas do Ruanda forneceram-lhes níveis de detalhe e acesso que não se igualam aos das forças de segurança moçambicanas em nenhum momento do conflito. A mudança para o Ruanda como o centro das atenções no esforço de contra-insurgência se reflete até mesmo nas publicações do EI. Um artigo no Al Naba na semana passada sobre as operações do EI em Moçambique e na RDC mencionou a intervenção ruandesa em Moçambique pela primeira vez, quebrando a política anterior do grupo de ignorar cuidadosamente as tropas ruandesas nas suas publicações. O artigo alegava que havia negócios obscuros por trás do destacamento de Ruanda.

Menos certo, porém, é o próximo passo para os milhares de civis que foram deslocados de Mocímboa da Praia quando os insurgentes tomaram a vila pela primeira vez. Falando com alguns residentes deslocados de Mocímboa da Praia que vivem actualmente na província de Nampula, fontes de Cabo Ligado encontraram três respostas gerais à notícia de que a vila está de volta às mãos do governo. O primeiro foi o optimismo - alguns acreditavam que poderiam voltar para suas casas nos próximos meses, agora que os combates na área terminaram. A segunda foi a suspeita - partindo da crença generalizada de que o objectivo do conflito é deslocar as pessoas das terras costeiras, essas pessoas acreditaram que, mesmo que a violência acabasse em Mocímboa da Praia, o governo ainda não permitiria que voltassem à área. A terceira foi o pessimismo - com base na experiência de algumas outras áreas de Cabo Delgado, essas pessoas eram céticas quanto à capacidade do governo de manter Mocímboa da Praia a longo prazo e não queriam regressar apenas para serem sujeitas a mais violência insurgente no futuro. Se o governo moçambicano quiser que os civis regressem a Mocímboa da Praia, terá de responder às preocupações dos segundo e terceiro grupos.

Resposta do Governo

A pressão para que os civis deslocados sejam autorizados a regressar aos seus locais de origem no norte pode aumentar caso os desafios daqueles que tentam ganhar a vida nas comunidades hospedeiras do sul de Cabo Delgado continuarem a aumentar. Nos distritos de Montepuez, Namuno e Balama, os preços que os deslocados têm de pagar pelos produtos alimentares aumentaram recentemente, em alguns casos quase 50%. Alimentos básicos como arroz e farinha de milho tornaram-se proibitivamente caros, deixando algumas famílias deslocadas a passar fome.

Em áreas que estiveram recentemente sob controlo dos insurgentes, no entanto, as notícias da semana passada sobre a situação humanitária foram amplamente positivas. O acesso aos cuidados de saúde continua a expandir-se lentamente mas de forma segura no distrito de Macomia, e um centro de vacinação COVID-19 foi inaugurado na vila de Macomia na semana passada. Professores e veteranos de guerra agora estão aptos a receber a vacina no local. Em Awasse, distrito de Mocímboa da Praia, o director da empresa pública Electricidade de Moçambique compareceu com o comandante-geral da polícia moçambicana Bernardino Rafael no dia 3 de Agosto para prometer a reconstrução da subestação eléctrica da localidade, o que irá melhorar significativamente o fornecimento da energia elétrica no norte de Cabo Delgado.

Actualmente, restam menos de 100 civis na vila de Palma, uma vez que a maioria dos civis na área fugiu ou refugiou-se em Quitunda, por orientação das tropas moçambicanas e ruandesas. Os que permanecem em Palma, no entanto, relatam que receberam fortes garantias das forças de segurança na área para não se preocuparem em serem confundidos como insurgentes, esta que era uma preocupação com a entrada de tropas ruandesas no conflito.

No plano internacional, os Estados Unidos adicionaram um segundo indivíduo à sua lista de pessoas sancionadas pelo seu envolvimento no que o governo dos EUA chama de “ISIS-Moçambique”. No dia 6 de Agosto, o Departamento de Estado anunciou que Bonomade Machude Omar - conhecido no conflito principalmente como Ibn Omar - foi nomeado Terrorista Global Especialmente Designado por seu papel na insurgência. De acordo com a designação, Omar é o “comandante sênior e coordenador principal de todos os ataques conduzidos pelo grupo no norte de Moçambique, bem como o facilitador principal e canal de comunicações para o grupo”. A designação alega que Omar esteve na linha da frente do ataque a Palma e é responsável pelos ataques no norte de Cabo Delgado e no sul da região de Mtwara, na Tanzânia. 

À medida que o SAMIM finalmente surge como uma força de combate em Cabo Delgado (que será abordado exaustivamente no semanário Cabo Ligado da próxima semana), as forças tanzanianas pareceram intensificar as operações domésticas em conjunto com a intervenção regional. Todas as aldeias num raio de 40 quilómetros da cidade de Mtwara estabeleceram postos de controlo de aldeia nas últimas duas semanas para verificar os documentos de identidade, e as patrulhas das forças de segurança na área estão a verificar os documentos de todos que se cruzam. No dia 3 de Agosto, a polícia tanzaniana anunciou que havia realizado operações no distrito de Kibiti com o objectivo explícito de interditar os insurgentes que haviam sido repelidos de volta à Tanzânia por operações moçambicanas e ruandesas em Cabo Delgado. No dia seguinte, o chefe da polícia da Tanzânia disse a jornalistas que os seus agentes estão a interrogar qualquer pessoa que atravesse a fronteira de Moçambique para se assegurar de que não estejam envolvidos na insurgência.

Detalhes sobre se e como o Ruanda e o SAMIM estão a coordenar as suas actividades em Cabo Delgado são difíceis de obter, mas na semana passada o ministro da defesa do Zimbabué, Oppah Muchinguri-Kashiri, viajou para Kigali a convite do seu homólogo ruandês, onde discutiram extensivamente sobre Cabo Delgado. O Zimbabwe comprometeu-se a enviar pouco mais de 300 formadores militares para Moçambique como parte da força SAMIM.

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